domingo, 31 de julho de 2011

João Arthur

João Arthur era um bom rapaz. Talvez um pouco desalinhado; afoito. Norteava suas ações através de seus ímpetos e tinha profunda ojeriza em conter impulsos e refrear instintos. Era chamado de sincero por uns, e de impulsivo por outros.

Não é possível discernir ou julgar quem possuía a crítica correta a respeito do João Arthur. Pois tudo varia em consonância com a situação, e mais do que isso: tudo depende do ponto de vista.

O principal: João Arthur tinha problemas. Muitos problemas. Aliás, quem não os tem? O fato é que com ele era – digamos – diferente. O fator primordial era a sua ânsia por realizar tudo o que, fertilmente, sua imaginação produzia. Se ele considerasse uma mulher bonita, instantaneamente interpelava-a, alvejando-a com adjetivos e descortinando suas intenções. Era um estardalhaço... Se alguém lhe ofendia, no mesmo momento esse ultrajante estaria sujeito a receber um pontapé ou um murro do lado do ouvido. E ainda: Se ele quisesse algum objeto que não tivesse dinheiro para comprar, roubar-lhe-ia se necessário fosse. Assim ele procedia. Precisava saciar suas veleidades, e a única maneira que encontrava para isso, era trazê-las à tona. Necessitava satisfazer seus desejos e cogitações.

Era um empreendedor nato esse João Arthur, porém um tanto exagerado e inoportuno.

Obviamente, ele acostumou-se a quebrar a cara. Agia mais do que pensava. No entanto, jamais se sentiu sufocado por incertezas, sempre pôs tudo à prova e à execução. Ele, realmente, prefere arrepender-se do que fez, não do que deixou de fazer – apesar de raramente se arrepender.

Só que, de tantos tombos, João Arthur foi “amadurecendo” sua personalidade, contornando-a e moldando-a de acordo com os padrões sociais, os quais advertem implicitamente que o bem sucedido não possibilita todas as cogitações, mas cogita todas as possibilidades. Talvez seja esse o segredo para se encaixar de forma harmônica e inteligente no meio em que se vive.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Perda de interesse

Toda relação de sucesso baseia-se em uma trinca de requisitos: cumplicidade, reciprocidade e confiança.

...

Ele estava apaixonado. Sem dúvidas. Faria tudo por ela. Quando um homem é pisado pela primeira vez e se sujeita ao segundo pisão, é porque, de fato, sente algo forte. Não é fácil pra um homem engolir seu orgulho e explicitar isso a uma representante do sexo oposto.

Talvez o motivo pudesse ser a obsessão, pois um homem obcecado é capaz de quase tudo.

Eu o entendo... Não há como não sentir vontade obsessiva, esmagadora e excruciante quando uma mulher te joga charme de forma furtiva. Nenhum homem resiste. Mulher com esse quê de mistério excita. Por isso que mulher excessivamente fácil perde a graça rapidamente - a não ser que ela tenha muita graça estocada.

- Tinha certeza que você sentia algo por mim... Não consigo entender, por que não? – Indagou ele, perplexo.

- Ah... Não sei o que dizer, não esperava isso de você. Mas acho que não é a hora... – Desconversou ela, com a malícia esbanjando em seus lábios carmesins.

- Tudo bem, minha imaginação fértil deve ter me traído... Desculpe-me. Devo estar mais vermelho que seu vestido.

Ela deu-lhe as costas, não excluindo a possibilidade de algo acontecer em um futuro próximo, deixando uma pontinha de esperança. O que, para ele, foi uma tortura inexpressável. Sua vontade era desencadear seus instintos mais ancestrais e agarrá-la, à força, arrastando-a pelos cabelos até sua caverna. Ou no caso, até seu carro.

...

Depois disso, ele nutriu um sentimento que ficava entre raiva e desejo, se é que isso é possível. Prometeu a si mesmo demover-se da idéia de conquistar aquela morena esplendorosa. Só que ninguém consegue desistir assim de uma morena dessas.

No convívio diário ela agia como se nada tivesse acontecido. Tornava a se insinuar, demonstrando interesse e angariando reciprocidade. Obviamente, ele cedeu aos seus juramentos. Encontrou-se com ela, externou seu desejo e dessa vez ela disfarçou o olhar, sorrindo, cheia de manha, e permitiu ser beijada. E que beijo! Desavergonhado, intenso, com mãos móveis e displicentes.

Era o que ambos queriam. Só que cada um demonstrava isso à sua guisa. Então passado algum tempo, eles queriam repetir a cena - com alguns "adicionais", é verdade. No entanto, ela estava meio arrogante, querendo que ele corresse atrás dela a todo instante. No início ele até o faria, pelo ímpeto irrefreável de descobrir... Mas agora a situação mudou. Pois sempre existem outras possibilidades.

Ela abandonou sua vaidade e passou a procurá-lo de forma mais direta e consistente. Ele adorou, estava a fim, mas não tanto quanto antes... Um amigo, a par da situação e abismado pela maneira desinteressada que ele passou a adotar em relação à morena, perguntou a razão deste novo panorama e até concordou com o que seu amigo filosofou...

- Cara, a perda de interesse em determinada coisa passa, necessariamente, pelo surgimento de interesse em algo novo. E, além do mais, ter preferência não é o mesmo que ter exclusividade.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Pernóstico

Há coisas – em especial palavras – que, em seu significado, contradizem a essência do que representam. Convenhamos que o termo “pernóstico” não é muito usual, significa “aquele que usa palavras difíceis propositalmente; de linguajar complicado”. Ora, a própria palavra “pernóstico” é pernóstica.

O pernóstico da escrita precisa de auto-afirmação, necessita expor todo o seu opulente léxico, repleto de expressões e analogias obsoletas, a fim de transparecer sua suposta superioridade intelectiva. No entanto, apesar da semântica ater a palavra “pernóstico” ao campo das palavras, considero que existem outros gêneros de pernósticos, em diversos segmentos.

Há o pernóstico do trabalho, que dificulta tudo, negligenciando a agilidade e burocratizando todas as ações. Para ele nada é simples ou acessível. Ah, e o chefe é um sortudo arrogante; Existe o pernóstico da convivência, que independendo o âmbito em que esteja, economiza gestos vênios, sorrisos e qualquer manifestação de afetividade e simpatia; E, para completar a trinca dos pernósticos mais comuns, apresento o mais nefasto deles: o pernóstico que age de tal forma consigo mesmo. Este tende a superdimencionar seus erros e a depreciar seus acertos, vetando, normalmente, elogios ou a possibilidade de sentir-se bem e pleno com quem ele é em sua essência.

Entendamos, portanto, estes os quais acima descrevi como forçosos ranzinzas. Toda espécime pernóstica é maquiada, deliberada: age premeditadamente e faz objeções à vida por livre e espontânea vontade. Não os confundamos com os que possuem personalidade sisuda e pessimista, porque estes são naturais; natos.

Ser avesso à simplicidade é um atentado; um distúrbio muito popular. Ser simples é não ser enfeitado demais. É fazer com que a extravagância e o garbo exagerado sejam esporádicos, bem direcionados e oportunos. E não o contrário.

Um pernóstico quer sempre dificultar por achar que isso o eleva. Se você não é inerentemente de mal com a vida e acostumado a amontoar empecilhos, criando obstáculos a torto a direito, ou você é pernóstico, ou boa praça de bem com a vida. Espero que seja a segunda opção.

domingo, 3 de julho de 2011

Ultrapassando limites

A problemática do trânsito é antiga, já vicejava em meados do primeiro século antes de Cristo, quando o imperador Júlio César baniu o tráfego de “rodas” durante o dia e limitou o número de carruagens que poderiam entrar na cidade. Era a primeira medida da História visando a melhorias neste âmbito. Atualmente o grande óbice para a harmonia enquanto nos deslocamos, diferentemente da Roma Antiga, é a violência, a aspereza nas relações...

Tornou-se habitual ouvirmos, diariamente, notícias tétricas envolvendo o trânsito. A cada ano que passa a velocidade que nossos automóveis empregam batem novos recordes, de intensidade e de mortes. Certamente este problema não pode ser ignorado ou preterido, face o nível periclitante a que chegou.
Muitas são as causas apontadas para explicar o comportamento agressivo e inconsequente ao qual estamos acostumados a nos deparar. Isso se justifica, pois, geralmente, quando um problema social conquista repercussão e notoriedade devido a sua importância – como é o caso - é uma junção de fatores que o levam a obter tamanha propalação.
O número elevado de carros, a insuficiência de vias qualificadas para o tráfego, a intolerância e o espírito de competição, são motivos de relevante contribuição para que a violência impere, como uma forma natural de agir enquanto dirigimos ou simplesmente transitamos pelas ruas. Ela, violência, deve ser encarada, portanto, como uma conseqüência e não como causa.
Há cada vez mais estímulos para a fomentação de espíritos belicosos, já que tudo atualmente é competição. Desde cedo aprendemos que devemos sobrepujar; sermos mais fortes, mais velozes, mais inteligentes... Com o advento da tecnologia, os dias passam com a velocidade de um supersônico e nossos interesses constituem nossa causa maior, onde, por diversas vezes, olvidamos de valores indispensáveis e relativamente simples, como compreensão, educação e tolerância. Assim como de gestos cordiais, afinal, quem tem tempo pra isso?
Sem falsos romantismos, a tendência é que este processo se acentue. Ele até pode ser combatido através de medidas governamentais inteligentes, no entanto, seriam apenas paliativos, porque a única forma de solucionar a questão da violência - não apenas no trânsito, mas também em outros segmentos - é evoluirmos em conjunto, cooperativamente. Dando vazão aos princípios que são necessários para uma boa convivência e lembrando que nosso umbigo não é o centro do mundo. Este é o melhor atalho para que a tranqüilidade seja a constante no trânsito, onde possamos trilhar caminhos pacíficos, ausentes de sangue entre as suas esquinas.