sábado, 30 de abril de 2011

A melhor das dúvidas

Há aqueles que perseguem a tepidez e a tranqüilidade da certeza. Mas será que há os que se sentem confortáveis e harmoniosos com a dúvida?

No fundo, talvez, todos rumamos ao fim esclarecedor, que não permite brechas ousadas onde impera a incerteza. É um processo natural. Possuímos um mecanismo movediço às resoluções e ao porquê de tudo. Necessitamos pôr fim às torturas das dúvidas e descobrir, invariavelmente, se é ilusão ou se há um quê de verossimilhança.

Aquele que persegue de forma contumaz sua ilusão, segue nesta linha para checar se existe razão em sua alucinada jornada. Geralmente esta busca é feita imperceptivelmente. E na esparsa maioria das ocasiões, culmina onde ansiava-se chegar, e, ao mesmo tempo, receava-se.

Almejamos saber se aquela pessoa realmente é o que aparenta; precisamos ter conhecimento sobre todos os nossos resultados; não suportamos protelações quando o nosso umbigo está sob o crivo implacável da avaliação alheia; angariamos certeza sobre tudo e todos, enfim. Ou seja, nada escapa da nossa ferramenta de avaliação, onde – muitas vezes – formulamos definições precipitadas e imaturas.

É... Nós, humanos, não fomos concebidos para satisfazermo-nos com o campo cruel e fértil da imprecisão. Nossa imaginação castiga tal feito. Somos curiosos inatos.

É reconhecido, portanto, que tendemos à exterminação dos provocantes pontos de interrogação que nos envolvem – embora nos arrependamos eventualmente. E é justamente este o dilema que me aflige e acomete neste momento; excita minha imaginação; fertiliza e inventa peripécias surreais; exacerba de tal maneira que já não distingue a “realidade verdadeira” e a “realidade fictícia”. Entretanto, é a única, ou uma das poucas dúvidas, que é prazerosa de sentir, em que pese a bagunça mental que fomenta.

A incerteza a qual me atinge e permanece, grudenta, no meu leque de raciocínios, não me permite tirar do pensamento aquela graciosa e linda guria. Será vã ilusão minha ou ela está retribuindo minhas disfarçadas investidas? Naquele olhar continha um brilho mais pungente que o habitual? Que incerteza cruel; que incerteza gostosa! Devo tomar jeito e assassiná-la ou fazê-la permanecer?

domingo, 17 de abril de 2011

O Lugar Onde Vivo

Certa vez, por entre os meus longínquos devaneios, surgiu-me a idéia de quem um homem é um fiel retrato de onde vive, e da forma com que pratica essa arte admirável. Estando, portanto, crivado das influências que tal lugar naturalmente impõe.

É trivial às mentes mais ambiciosas e sonhadoras, vislumbrar um possível futuro em algum outro espaço, geralmente mais pomposo e promissor. É frequente, também, que este pensamento seja comum a todos os homens: eternos insatisfeitos diante do tangível e atual. Insaciáveis! Que mania execrável essa de superestimar o que ainda não alcançamos, com isso – muitas vezes – depreciamos o que está conosco e já faz parte de nós. Como são admiráveis as pessoas que costumam agradecer mais assiduamente pelo que tem, do que vituperar ao mundo pelas suas lacunas.

Eu cresci acariciado pelo ar puro do bairro Hípico, rodeado de verde. Verde esse, aliás, que infelizmente está cada vez mais cinza aos meus olhos. Todas as manhãs um belo horizonte se apresenta a mim, através da minha janela. Moro num lugar pacato em comparação ao frenesi das grandes cidades. Mesmo assim, aqui há uma diversidade muito grande, que se se torna ostensiva devido ao contraste da gente daqui. Aliás, que brilho teria a vida sem as diferenças?

A pequena, mas altaneira cidade de Camaquã, destaca-se pela produção de arroz e carrega consigo fatos contundentes da história do Rio Grande do Sul. Tem como padroeiro São João e é um pólo regional. Seu povo é hospitaleiro e costuma “erguer a voz” diante das adversidades. É aqui que eu nasci, cresci, e é essa terra que aprendi a amar, com todas as suas pungentes curiosidades e idiossincrasias. Como o seu nome, que significa rio correntoso, por localizar-se às margens das torrentes de um belo rio. As maiores atrações turísticas são a Barragem do Arroio Duro, por sua esplendorosa beleza natural, e o Forte Zeca Netto, que reúne relíquias históricas da Guerra dos Farrapos, ou Revolução Farroupilha.

Existe um grupo seleto de coisas em nossas vidas, que quando as experimentamos temos certeza que não há nada do mesmo ramo, melhor ou mais bonito. Uma certeza tão profunda e intensa que não se permite estar errada. Este é o meu sentimento, quando, de cima do meu terraço, contemplo o pôr do sol de Camaquã. Este é o lugar onde vivo: Um recanto onde a simplicidade é o encanto, e o entardecer é o espetáculo mais lindo que se possa ver.

Julian Assange e Segredos

Recentemente ouvi muitas apregoações por aí difamando os segredos. Achincalhando-os. Como se fossem sinônimos e mau-caratismo e aversão à ética.

Julian Assange é o herói dos desvendadores da torrente modernista dos cliques aqui e acolá. Admiro sua coragem e seu instinto de jornalismo investigativo. Ao contrário do que posso ter suscitado, eu considero os seus feitos positivos. O Wikileaks é um manancial de transparência e ousadia. É o troco dado aos influentes poderosos do globo, pois eles sabem tudo a respeito de quem quer que seja – desde que lhe interesse.

Assim como o inventor do site, eu gostaria de ter visto a cara daqueles que se viram desnudos pelas surpreendentes descortinações. Vários segredos diplomáticos encarcerados a sete chaves caíram por terra. No entanto, há que se fazer uma distinção entre os segredos. Há os que devem ser revelados, sim. E há, igualmente, os que devem permancer no anonimato, guardados em nossos profundos compartimentos internos. Nem tudo deve ser mostrado. Como seria oca a vida sem a dúvida; sem a instigação por descobrir. Quão cinza seria nossos dias se soubéssemos a respeito de tudo, se os cintilantes pontos de interrogação fossem facilmente exterminados.

Aposto que você, assim como eu, já de decepcionou ao transformar uma interrogação em um revelador e mero ponto final; fez de tudo para descobrir e no momento derradeiro, frustrou-se. Acontece. Mas imagine-se sem esse caminho intermediário, de busca, de curiosidade... A vida seria um poço de mesmice, repleta de estagnantes e peripécias sisudas.

Aplaudo, sim, as façanhas de Assange, pois sua abnegada e incessante busca desfacelou obscuridades escusas e monopolizadas por uma classe do mais alto poder. Nosso bravo herói só conseguiu porque atualmente a tecnologia é um milagre, a maior criação humanda de todos os tempos – e a mais pragmática também. Facilita a vida, é verdade, mas a oblitera de certos fascínios, como os segredos íntimos de alguns incautos, que preferem despirem-se virtualmente, apresentando, de forma despojada, seus modos, trejeitos e sentimentos. Eu, como bom saudosista e amante de antigos costumes, prefiro o fazer em um imaculado pedaço de papel, com lápis ou caneta.