Omissão
Enquanto eu viajava rumo às belezas monumentais e naturais da catarinense Camboriú, avistava ao longe os belíssimos morros esmeraldas que acompanham todo o trajeto. Neles, invariavelmente, havia pontos coloridos destacando-se em meio ao mar de verde... Minha memória recorreu, de imediato, às calamidades cariocas de pouco tempo atrás. Simultaneamente a isso, a Natureza fez o que costuma: suscitou uma percepção até então inexplorada...
A maioria dos semelhantes que conheço, tem a aviltante mania de omitir-se da responsabilidade; prefere ficar à espreita, fora de foco, apenas como um mero complemento da paisagem, sem a menor presunção em chamar para si o pedestal e protagonizar nos palcos da vida. No fundo, elas até aspiram a isso, mas aos poucos vão deixando impregnar a tépida indiferença em si, já que ela está tão abrangente na maioria dos cantos.
Tenho dó de São Pedro. É ele quem tem a árdua incumbência de saciar a sede. Sua missão é bem mais tortuosa do que servir um simples copo d’água. Carrega nos ombros o dever de não permitir que toda a terra – e todos que nela habitam – sucumbam. Fornece e distribui a água; este bem tão precioso quanto depreciado. Sempre exerceu seu trabalho de forma absolutamente primaz, mas eis que cintila o maior coadjuvante, exercendo papel contundente: o homem.
O tempo foi passando e as interveniências no ofício, digamos, regador de São Pedro, concomitantes com sua já avançada idade, foram dificultando-lhe a ótica. Está quase míope. E, tristemente, não pode se dar ao luxo de equipar-se com um miraculoso óculos celeste. Lá ainda não se produzem estes equipamentos.
O resultado está evidenciado pelos meios de comunicação. Como um idoso desprovido de óculos erra o copo ao se servir, São Pedro “já” não desempenha sua função com a mesma indefectível destreza. Não irriga de forma equilibrada. Esse é o motivo das chuvas torrenciais no Rio e da tórrida estiagem em Bagé, no interior gaúcho.
Diante das enxurradas de vituperações à facínora água, obrigo-me a enfatizar um fato tão verdadeiro quanto encoberto: a chuva NÃO é assassina e NÃO tem culpa pelos desastres, como ouço insinuações nos meios comunicativos. Temos uma natural inclinação a nos desvencilharmos da culpa... Mas neste caso, seria o mesmo que considerar culpada a janela pela paisagem que vislumbramos.
Deveríamos corar a tez mediante toda nossa apatia. Dificultamos o trabalho de São Pedro, não nos precavemos e ainda isentamo-nos de culpa, jogando-a, a queima roupa, na coitada da Natureza. O trecho destacado em negrito no primeiro parágrafo é o que mais ouvi, talvez com outras palavras, mas que rumam ao mesmo lugar. Omissão, omissão... No entanto, não me surpreende. É com o que estamos acostumados a lidar.
Há o tipo de pessoa que quando erra, nega; e o tipo insólito que, depois do erro, bate no peito, assume de queixo erguido sua falha e arca com suas responsabilidades. Esse tipo de gente eu respeito. Esse tipo deveria ser a maioria.
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