Seu Miguel e Suas Histórias - Prólogo
Esse ser evoluído, já com o cunho de sapiens ao cubo, não passa de um mero reflexo do seu habitat, e dos adágios que o circundam. Não se fazem mais homens como antigamente. Nos tempos atuais a vasta maioria deles está imersa em sua abissal lucidez. Se um deles tentar respirar por um instante, será ultrapassado, obsoletado. Não se permite o ócio: o mais belo e albuminoso momento, e quando é proporcionado – por uma providência divina – o aproveita canhestramente. A arte é fruto do ócio bem exaurido. Por isso que só há pragmatismo... o tempo ruge. Quando dei essa análise previdente à minha professora do extinto segundo grau, no ano de 2010 – se minha memória não me trai – ela não acreditou, e fui taxado de exagerado.
Agora, em 2051, enquanto as águas do aqüífero guarani se obliteram, eu solapo algo assaz a exterminar com esta sede corrosiva. Já sorvi, no mínimo, dois litros de café e nada adiantou. Confundimos a sede da alma com a fome do corpo. Infelizmente depois que a Carmem se foi, ambas se acentuaram. Mas, como aconselha qualquer filósofo de araque, é a vida. Sim. O pior é que esse infeliz está tapado de razão.
Meus netos me consideram o mais inconseqüente dos insanos, vêem-me como um dissoluto, já que sou amante do aconchego do meu lar. Depois que a tecnologia me aposentou juntamente com minhas crônicas e com o jornal, virei um velho saudosista e nostálgico. Possuo um Grand Cânion no meio do peito, quero uma máquina do tempo mais efetiva que minha imaginação. Quero tanger minhas veleidades. Mas, quando há o impossível de fato, temos que transformar o alcançável no melhor possível. Mesmo ele parecendo não suficiente.
No entanto, há também as flores, é verdade. Sempre há.
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