Paraguaio
Eu precisava chegar até os Correios naquela tarde. O dia posterior era feriado, e se eu expedisse o cartão postal somente na quinta-feira, talvez – ou muito provavelmente – eu chegaria antes dele ao seu destino: Camaquã. Já que o retorno da paradisíaca Camboriú será na parte matutina do domingo, a fim de evitar engarrafamentos.
Pois bem, destinava-me até lá, quando, do nada, o céu ganhou uma tonalidade escura; um profundo gris se apoderou do que era, há poucos instantes, predominado do mais belo azul celeste. Pus-me a caminhar como caminharia o Usain Bolt, não queria correr, estava de chinelos e com o estômago forrado por uma profusão de almôndegas.
Alguns minutos depois e... começou a chover, é claro. O que eu faria? O apartamento estava longe, assim como o Correio. E, dessa vez, não estava disposto a um banho de chuva. Encontrei então uma bela e espaçosa marquise: minha salvação. Fiquei ali e os estalidos tonitruantes permaneciam. Até que foi proveitoso, contemplei uma bela paisagem: meninas molhadas, gente correndo atordoada, os incessantes pingos de chuva procurando brechas nesta verdadeira selva de pedra: asfalto pra lá, cimento pra cá...
Até que, alguém – um senhor de meia idade, depois percebi – me dava olhadelas furtivas embaixo daquela mesma marquise. Aproximou-se e então percebi que ele olhava não para mim, mas para meu relógio.
- Tiene horas, menino? – Indagou o senhor que julguei ser argentino.
- Ah sim, são 3:30 señor.
- Muchas gracias, uste es brasileño, no? Me pareció argentino...
- Sim, brasileiro. O señor és argentino... – Presumi, arriscando um defeituoso portunhol.
- No, no... paraguaio. Pra que equipo torces? – Perguntou de imediato, a fim de ser simpático e puxar conversa, arranhando um portunhol.
- Grêmio de Porto Alegre, time mais copeiro do Brasil. E o señor?
- Olympia, do Paraguai. My equipo ya eliminou Grêmio de la Libertadores. – Disse, com um sorrisinho que ficava entre escárnio e orgulho.
- Sim, nas oitavas de final, no? Mas meu time és Bi-campeon, lamento mucho. – Retruquei, à altura.
- Ah, si, es cierto... Mi hijo fez... como se chama?... intercâmbio estudantil em Porto Alegre, residia a dos cuadras del cancha del Grêmio. Le encanta la camisa Del Gremio, muy hermosa. Tiene uma inclusive.
- Muy interesante. – Disse, sem saber de que forma continuar a conversa. Que oportunamente terminou quando a chuva atenuava e o paraguaio despedia-se com um largo sorriso no rosto, desejando um bom ano e suerte.
Imitei-o e segui meu rumo, remeti o cartão-postal no correio e regressei ao apartamento. Ia junto de mim uma sensação aprazível, de bem estar... Surgiu-me, então, uma bela concepção: Nada é exclusivamente para o bem ou para o mal. O futebol, por exemplo, pode ser pretexto para a violência, ou motivo para novas relações e agradáveis diálogos. Depende, unicamente, de como o usamos.
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